sexta-feira, 19 de outubro de 2007

..:: palavras que nos salvam ::.. Rosa Lobato de Faria # 3

Hoje o computador não exorciza a minha angústia. É uma confusão de sentimentos complicada de mais. Não me quero focar no que principalmente me aflige e por isso, enquanto escrevo, tenho sempre aquele travão a segurar-me o livre fluir do pensamento. Tive a ilusão, na euforia dos acontecimentos da noite, que ia ser capaz de ser outro, mais corajoso, mais desinibido, mais eu mesmo. Como diz o Hugo, não podemos passar a vida a ser quem não somos e, nessa tentativa, confundirmos as coisas. Quem sou eu afinal? Porque é que sou tão infeliz? Hoje em dia todos sabem que se nasce homossexual como se nasce canhoto. Não é uma escolha. É até um lugar comum dizer-se que, se fosse, ninguém escolheria o caminho mais difícil.
O Hugo pode ajudar-me. Com a sua paciência, o seu sentido de humor. Ao pé dele tudo parece fácil, natural. Gostava de me sentar com ele à mesa dos meus pais e dizer, o Hugo é o meu namorado. Somos felizes juntos, a vida fica mais leve, é óptimo não ter que fingir. E os meus pais haviam de dizer, olá Hugo, seja bem-vindo.
Mas não é assim. Hão-de obrigar-me a mentir, a fingir, a desprezar-me, a perder a pouca auto-estima que me resta.


Rosa Lobato de Faria » A Alma Trocada (Porto: Asa) » 2007 » pp. 27-28

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