sábado, 19 de janeiro de 2008

..:: palavras que nos salvam ::.. Eugénio de Andrade

[Fundão, 19 de Janeiro, 1923 † Porto, 13 de Junho, 2005]


Se fosse vivo, Eugénio de Andrade (ou José Fontinhas) faria hoje 85 anos. Uma pequena homenagem com dois poemas que nem são os que gosto mais, mas o primeiro porque o tenho declamado pelo próprio e musicado; o segundo porque já o analisei com pouco pudor (ou melhor, com menos pudor do que é costume fazerem-no).

*****

Aquela nuvem

- É tão bom ser nuvem,
ter o corpo leve,
e passar, passar.

- Leva-me contigo
Quero ver Granada.
Quero ver o mar.

- Granada é longe,
o mar é distante.
Não podes voar.

- Para que te serve
ser nuvem, se não
me podes levar?

- Serve para te ver
e passar, passar.


Eugénio de Andrade

*****

Nas ervas
Escalar-te lábio a lábio,
percorrer-te: eis a cintura,
o lume breve entre as nádegas
e o ventre, o peito, o dorso,
descer aos flancos, enterrar

os olhos na pedra fresca
dos teus olhos,
entregar-me poro a poro
ao furor da tua boca,
esquecer a mão errante
na festa ou na fresta

aberta à doce penetração
das águas duras,
respirar como quem tropeça
no escuro, gritar
às portas da alegria,
da solidão,

porque é terrível
subir assim às hastes da loucura,
do fogo descer à neve,

abandonar-me agora
nas ervas ao orvalho –
a glande leve.


Eugénio de Andrade

2 comentários:

  1. Confesso que fiquei completamente nas nuvens, ao ler e ouvir as palavras do Eugénio.
    Um abraço

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  2. Olá! Pelo link que puseste para a revista onde publicaste o teu artigo deduzo que não saibas que está disponível, tal como outros dos diversos números da Pretextos, no site do Instituto Camões, em:

    http://www.instituto-camoes.pt/cvc/bdc/revistas/textosepretextos/index.html

    Descobri-o quando no meu ano de estágio levei os meus meninos do sétimo ano à Fundação Eugénio de Andrade e pesquisei mais sobre o senhor. Não o li na altura, porque o tema não era o mais apropriado ;) mas lerei, com certeza.

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