A maior parte dos episódios marcantes de que me lembro não é localizável com exactidão, mas lembro-me da idade de alguns (mais ou menos, ok):
§ antes dos 3 anos – lembro-me que prendia a gaita na braguilha e gritava que nem louco, para desespero da minha mãe que me passou a fazer andar sem fecho e com a pila sempre de fora.
§ 4 ou 5 anos – a queda ao poço: podia ter lá ficado, agarrado ao lodo, sob uma camada de algas, mas determinou o destino que ainda não tinha chegado o meu tempo. Era pequeno, mas lembro-me muito bem: o passo em falso na escaleira e a queda de frente. Não me levantei, foi a minha irmã que ao longe me ouviu cair e correu no meu encalço. Fiquei inconsciente e só me lembro de ter deitado água fora, chorado muito, de me terem ido buscar uma toalha, da minha mãe me ter abraçado com muita força e me ter ralhado muito.§ a morte de Sá-Carneiro (esta é fácil de determinar), mesmo no meio do nada, as pessoas ficaram em choque.
§ 4 ou 5 anos – apareceu lá uma garota da minha idade, neta de alguma vizinha, que teimava em me mostrar as partes, além de me obrigar a brincar aos doutores. Quando fomos apanhados, levámos um raspanete memorável.
§ 5 ou 6 anos – um rapaz mais velho (adolescente) brincou comigo, sem qualquer tipo de violência. Não percebi muito bem: foi um misto de não achar piada nenhuma e de impressão que aquilo até tinha alguma graça.
§ 6 anos – a morte de um empregado do meu pai, que se afogou no Zêzere: o barco afastou-se, quando subia para ele, caiu na água e não sabia nadar. As mortes por queda, com água ou fogo sempre foram as que mais me angustiaram. Já devo ter passado por elas noutras vidas.
§ 6 anos – passei a morar com os meus avós, numa quinta isolada, auto-suficiente, sem electricidade, mas com água canalizada e saneamento.
§ 7 anos – a neve: quase todos os anos neva um pouco, mas naquele Inverno nevou imenso, foi fantástico! Com o sol, até doía olhar.
§ 7 anos – a escola: tinham-me levado com seis, mas não fui aceite porque só fazia os 7 em Janeiro. Foi uma desilusão, além de ter que estudar à noite à luz da candeia de azeite. Tinha uma ardósia que depois foi substituída por um caderno quando já sabia escrever.
§ 8 anos – um colega dormiu lá em casa. Ficou na minha cama e eu quis brincadeira, mas ele não achou graça, não alinhou e ainda ficou chateado comigo.
§ 9 anos – duas colegas de escola mais velhas quiseram porque quiseram ver como éramos. Tinham prometido retribuir, mas nunca chegámos a ver nada.
Há coisas incríveis, não há?!
Delicioso texto, este, caro Paulo.
ResponderEliminarDe tudo o que se posta na blogosfera, o que mais me encanta são as memórias pessoais, como tu lhe chamas, e que eu também gosto de ir contando.
quando a memória recua aos tempos de criança, ainda mais me agrada, pois as recordações que estão vivas, foram mesmo marcantes e estão eivadas da pureza dessa idade.
Fizeste-me ir revisitar o meu passado de menino dessa idade, pois há experiências que são vividas por todos nós, de uma forma ou de outra, como por exemplo o "brincar aos médicos" e os primeiros sinais do que no futuro queremos realmente ser quanto ao sexo.
Obrigado grande pela partilha!
Abração.
Acabei de escrever qualquer coisa sobre coisas que estao em nos.
ResponderEliminarAte tenho os olhos cheios de lagrimas!
E convem dizer que a musica em fundo tambem ajuda!
Ai Paulo, nove anos de pura pornografia!
ResponderEliminarBjs da Monga
Recordar é viver, «né»? (onde já ouvi isto?)
ResponderEliminarCom este teu memorial, acabei por recordar os meus tempos de meninice...
Obrigada!
Renovados votos de bom fim-de-semana! Divirtam-se! :-))
Nada como a inocência e as recordações...
ResponderEliminarResposta colectiva: Pinguim, Ângelo, Monga, Shadow e Jasmim, obrigado pelos vossos comentários. Quem me conhece um pouco mais sabe que tive um percurso bastante peculiar, sui generis, no mínimo. Claro que todos nós temos episódios dignos de recordação, e ainda bem que assim é. Que seríamos de nós sem passado. Eu também gosto de ler textos que sejam registos pessoais (talvez também por isso me tenha dedicado um pouco às autobiografias e ao intimismo). A escrita é uma forma de registar o passado e manter a memória viva. Espero que as viagens que fizeram ao passado, vos tenham feito e continuem a fazer bem. Eu ainda não terminei a minha, mas não há mais experiências de pura pornografia, Monga e Pinguim. Estas memórias não me trazem lágrimas, Ângelo, mas compreendo-te muito bem. A música faz-me lembrar o bulício e a saudade, foi escolhida por isso.
ResponderEliminarVotos de grande fim-de-semana a tod@s, com beijinhos e abraços e bibam as nossas memórias!
:( cheguei tarde e não tive direito a ter o meu nome no comentário colectivo .
ResponderEliminarQuero agradecer-te despertares em mim essas memórias e não querendo melgar mas já melgando, só quero contar que aprendi a nadar com 4 anos nas costas do meu avô :))))
Beijinhos e obrigada por me fazeres sorrir...
Pois é, Sónia, como não vieste a tempo da resposta colectiva, cá vai uma individual: não tens de agradecer nada. Como eu escrevi no último post sobre a minha infância eu aprendi sozinho, mas às costas do avô deve ser muito mais giro! Nunca tive grande intimidade com os meus avós, porque o respeito e a distância tinham de ser preservadas. É engraçado que dos meus irmãos mais velhos quase nenhum sabe nadar, eu nem sei como consegui, mas o tanque não era fundo, apesar de grande em largura. Adorava ir para lá. Eu também sorrio ao lembrar-me das coisas parvas e loucas que fazia e que me fizeram o que hoje sou.
ResponderEliminarBeijinhos