segunda-feira, 1 de outubro de 2007

..:: as cores do dia ::.. Joãozinha

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Fui o seu menino. Ela foi a minha maçã d’oiro madura azul. Ainda seremos isto um ao outro? A amizade que desenvolvemos era de uma cumplicidade ilimitada, pelo menos da minha parte, porque o mistério sempre dominou a Joãozinha, com zonas impenetráveis. O visual um pouco gótico, muito dela, fascinava-me, mas era sobretudo a criatividade que despertava em mim a necessidade de me abrir para a absorver com os seus raciocínios que, confesso, me deixavam à toa.
A Joãozinha foi a primeira a abrir-me de facto os horizontes, a fazer-me perceber que há muitos mundos neste mundo cão. Foi a ela que, pela primeira vez, falei da minha orientação sexual. Ela não percebeu imediatamente a importância daquela confidência, porque lhe era tão natural que nem tinha pensado na complexidade do que eu sentia. Pouco tempo depois, havia de me apresentar o Esseme, o meu primeiro. Foi uma abordagem lenta e difícil: sou de muitos mistérios também porque nunca revelo tudo. Queria que o mais importante morresse comigo. Um dia, havia de ceder ao convite de Esseme para chá e torradas (assim, tal e qual). O convite era tão inusitado que aceitei, percebi que tinha de acontecer. E aconteceu, repetindo-se durante três anos. A Joãozinha acompanhou tudo: o gozo, as lágrimas, as discussões. Foi com ela que, naquele dia aziago, eu chorei baba e vísceras. Foi com ela que desabafei quando o Esseme chegou junto de mim com um vulcão nas mãos chamado Apê. Um vulcão em erupção contínua. Tinha de ser em Madrid que eu haveria de mandar aquele calvário à merda (a novela continua em textos próximos).
Quando segui o meu caminho, a Joãozinha ficou para trás com o namorado. Cada um seguiu por caminhos diferentes. Havíamos de nos cruzar pontualmente para constatarmos que éramos vivos. Nada voltou a ser como tinha acontecido. A Joãozinha viveu sempre pela metade e, quando chegou o seu homem, ela teve a certeza que tinha de o agarrar, como quando se tem a lucidez de que aquele é o momento, por muito sofrimento que tal acto traga.
Aquele mistério que nos unia cortou-se. Considerava que tínhamos resolvido mutuamente os problemas desta vida. Se calhar não. Um reencontro trouxe à flor da pele tantas angústias que é preferível não regredirmos muito e concentrarmo-nos no presente. Definitivamente, os capricornianos têm personalidades tão labirínticas como os nativos dos outros signos, mas só nós para não nos perdermos noutro capricorniano. Sinto que, com os capricornianos, que não preciso de revelar metade do que tenho de revelar a outros para atingir o mesmo objectivo. Olharmo-nos bastou.
Devias ter-me estendido a mão quando deixei o Esseme e o Apê? Na altura, achei que sim. Senti que me tinhas traído, fizeste-me muita falta. Mas tudo se diluiu no tempo: não sou de ficar a moer em águas passadas. Além disso, nunca foi preciso dizeres-me que não andavas bem para eu o perceber e perdoar tudo. Por ti conheci pessoas giras e inesquecíveis. Lembras-te da Manuela? Podias ter seguido o teatro, a escrita, as línguas… Foste tu a apresentar-me o teu colega Zé, talvez em 96 ou 97, que na altura andava tão enevoado que nem reparou em mim ou como eu bebia os seus olhos e as suas palavras. Eu, pelo contrário, e desculpem o pretensiosismo, achei que havia ali muita terra para eu explorar: fiquei preso ao olhar azul, à voz doce e firme, à face dura e magoada. Pareceu-me que o conhecia desde sempre. Havia de esperar até 2001 para o conhecer realmente, no sentido bíblico do verbo e perceber que não precisava de continuar a caminhada: era ali mesmo que queria ficar. Não foi amor à primeira vista. Fiz o que tinha a fazer: agarrá-lo como quando se tem a lucidez de que aquele é o momento, por muita felicidade que tal acto traga.
A Joãozinha sempre revelou pouco, revelando muito. Diz-me o João, que também é capricorniano, que temos personalidades complicadas. Absolutamente de acordo. A Joãozinha canaliza isso para o seu mundo pessoal e para a escrita. Os seus gestos são tão teatrais que encantam. És bela como as manhãs cheias de sol! Dizes-me que o tempo não passa por mim. Pois é, continuo o mesmo garoto que veio de trás do sol-posto, o teu menino. Só que fiquei mais seguro e rebiteso. Os dias tornaram-me mais duro e pus a máscara do sorriso. Não esquecemos que na noite não há só escuridão (e é isso mesmo que nos assusta). Neste reencontro, definitivamente, tive a certeza: hei-de ser sempre o teu menino e tu a minha musa. Também espero que não nos esqueçamos de voltar!

5 comentários:

  1. Um belo elogio à amizade...!
    Por certo, não vai esquecer-se de voltar!

    :-)

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  2. Voltei...

    Não, não esqueci o casaco:-) Esqueci sim, de fazer uma referência à fota.
    Boa escolha, Paulo! Parabéns!

    :-)

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  3. Shadow, a referência ao casaco fez-me rir um bocado. Pareço eu que quando me esqueço da cabeça em casa :)
    Bom, espero que ambos não nos esqueçamos de voltar. E quanto à foto, é muito de plástico; gosto porque é minha :), mas também gosto das flores e das cores artificais.

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