domingo, 11 de novembro de 2007

..:: palavras que nos salvam ::.. André Benjamim # 4

- Também gosto muito de ti. – Eu não tinha coragem para dizer mais que isto. O meu coração batia forte e aceleradamente. Não conseguia deixar de pensar se seria só amizade aquela manifestação de carinho. Mas o que podia fazer, se tremia por dentro só de pensar na hipótese remota de lhe dizer «Amo-te», Amar era um verbo utilizado com as mulheres, e muito vagamente com os filhos enquanto são novos. As relações dos adultos esfriam e tomam-se de circunstância. Mas eu amava-o. Não conhecia outro verbo, ou adjectivo, ou advérbio, ou palavra que qualificasse aquilo que eu sentia.
[…]
- Eu também te amo…
Engoli em seco as minhas próprias palavras. Tão belas, tão perfeitas, mas tão duras e tão dolorosas. Sentia que o mundo todo nos olhava repreensivo e escarnecedor, do cimo da sua hipocrisia e fingimento. Se eu ou ele fôssemos uma mulher, o mundo todo estender-nos-ia uma passadeira vermelha e luzes brilhantes e aplausos dirigir-se-iam ao nosso encontro. Assim, o mundo virar-nos-ia as costas com desprezo e escárnio, lançando-nos epítetos lancinantes que nos atingiriam em cheio no coração.
[…]
-Quem me dera que eu e tu pudéssemos ser um só… - Disse-me. Sentou-se no soalho de madeira carcomida, puxando-me para ele. Eu sentei-me no chão envolvendo a sua cintura com as minhas pernas. Pegou-me nas mãos, agarrando-as ternamente com as suas; cruzou os seus dedos nos meus. Eu fitava os seus olhos claros e cintilantes. Faltava uma hora e meia para as cinco da tarde, a hora em que tínhamos que estar de regresso ao colégio.
[Sébastian]

André Benjamim »» Os Cadernos Secretos de Sébastian »» Vila Nova de Gaia: Editorial 100 »» 2006 »» pp. 87-89

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